Não querendo parecer ou ser sexista creio que o assunto sobre o qual me debruçarei em mais uma reflexão precisa de um enquadramento e de intervenientes, e como o ditame para tal empresa veio de um camarada de armas (homem portanto…) e focado sobre uma mulher, poderá levar alguns a pensar que este energúmeno só vê saias dado que só escreve sobre elas…Nada mais errado até porque, como verão mais adiante, este juízo e outros que se vão falando nesta taverna poderá ser identificado ou desvelado por ambos os sexos.
Este jovial rapazote conta-nos a história de um relacionamento seu com uma moça e que terminou de uma forma algo bizarra: despediram-se após uma noite exemplar, e nunca mais voltaram a ver-se…
Nenhum dos dois supôs que seria a última vez que se tocariam as mãos e trocariam olhares!...
Sem uma zanga, amuo, arrufo…nada!
Um mero capricho do Destino talvez, digo eu…
Mas a verdade é esta: segundo ele, esta mulher foi e é perfeita, pois o tempo que dividiu com ele foi laureado com uma brancura imaculada de perfeição, só comparada com o gelo que cobre as manhãs de Primavera ainda demasiado apegada aos rigores do Inverno que findou…
As palavras certas na altura certa, magistralmente orquestradas pela batuta de algo Divino que parecia conspirar para que aqueles dois terminassem num beijo…
Tudo fluido, tudo primoroso, tudo perfeito…como ela!
“Até amanhã?”
“Sim, até amanhã…ah, e adorei esta noite!”
“Eu também…”
…E foram estas as últimas palavras que trocaram!
Esta mulher congelada no tempo na sua forma mais cândida, tem guardados na sua mão momentos também eles irrepreensíveis e que se conservam desta forma na memória do nosso amigo.
A verdade é que todos somos ou fomos perfeitos um dia…
Quem nunca se sentiu ofuscado pela luz de alguém que nos tocava particularmente numa dada altura das nossas vidas? E essa mesma luz de tão forte que era, varria os pequenos defeitos que todos temos, fundindo-os naquela aura de encanto! Perante tal deslumbre o que são indícios de mau feitio? Envoltos em tal turbilhão de beleza, não são mais que pequenos traços…
O velho e obstinado tempo é o responsável pelo decadente apagar de tal chama, deixando as sombras e os medos acumularem de velhice a fronte de quem um dia foi o sol para nós.
Mas este episódio foi diferente…
Como ambos nunca supuseram que um dia não se voltariam a ver, nunca o medo assombrou a relação, e como o término da mesma foi ainda numa etapa deveras precoce o efeito foi aquele que os antigos romanos desejavam alcançar com o suicídio numa idade ainda muito jovem…levar para a morte a beleza da aurora da vida!
Naquela etapa do seu breve e galante relacionamento os dois ainda se encontravam nessa página que poderemos chamar-lhe de “fase Adónis”, e como o destino ceifou o tempo à mesma, não se propiciou circunstância para nenhum dos dois mostrar o que todos temos de “menos bom”…
“Nunca poderei esquecer aqueles olhos enormes que me esperavam no carro, e que se iluminavam ao ver-me sair da porta dos meus pais... nunca lhes consegui resistir e iluminava-me também, sorrindo compulsivamente!
Acho que ainda hoje quando passo pela entrada do prédio, vejo qualquer coisa, um qualquer brilho…”
Não consigo deixar de pensar o quanto é injusto o facto que a beleza, perfeição, chamem-lhe o que quiserem, não passe apenas de uma questão temporal…uma memória isolada de todas as outras, pois só desta forma se mantém livre de mágoa e amargura.